A obsolescência programada, também conhecida como obsolescência planejada é um fenômeno utilizado por alguns fabricantes para fazer com que determinados produtos tenham uma vida útil menor. Dessa forma, o consumidor é obrigado a comprar novamente o produto e fazer girar a estrutura do consumo desenfreado.
O produto vem de fábrica com sua data de validade já curta, programado para quebrar depois de alguns anos (ou meses), ou simplesmente dar defeito em alguma peça que “não é possível trocar”. Dessa forma, um produto que poderia durar anos acaba indo pro lixo em pouco tempo. E lixo, você já sabe, não desaparece e, muito menos, vira adubo para plantas dentro de poucos meses. O lixo eletrônico, quando não é descartado de forma ecologicamente correta, pode acabar em mãos erradas e colaborar para a destruição do meio ambiente. Vamos entender melhor como funciona a obsolescência programada?
Você se lembra? Antigamente a bateria do celular vinha separada dele, bastava que o consumidor a colocasse dentro do aparelho e, caso ela desse algum problema de funcionamento, a troca era muito simples. Hoje em dia, o normal é que a bateria já venha dentro do smartphone, o que dificulta sua troca já que muitas empresas põem fim à garantia do celular caso ele seja aberto em uma assistência técnica não autorizada. Você agora deve estar pensando “o que bateria de celular tem a ver com essa tal obsolescência programada?” Então vamos seguir…
Como a obsolescência programada surgiu?
No início da década de 20s o mercado automotivo estava saturado, isso porque, a maioria das pessoas que tinham condições para comprar um automóvel já haviam adquirido o seu. Esse fato preocupou os empresários de uma grande fábrica de automóveis e, em 1921, a Dupont (indústria de químicos) se tornou sócia majoritária da fábrica de automóveis e nomeou Pierre Dupont como o novo CEO da companhia. Estando à frente da companhia e, contando com o conselho do executivo Alfred Sloan, Pierre teve a iniciativa de usar as tintas que a Dupont já produzia para criar carros de cores diferentes. Foi dessa maneira que, a cada três anos foram surgindo novas cores e coleções de carros. E assim foi se estimulando o consumo por aqueles que até já tinham um carro, mas que queriam ter o último modelo e cor, ainda que sem grandes mudanças no desempenho ou na tecnologia empregada. Na época, essa estratégia foi batizada por Sloan de “obsolescência dinâmica”.
Hoje em dia, esse fenômeno de mercado é chamado de “obsolescência perceptiva” que é empregada não somente na indústria automotiva, mas também, na indústria da moda, dos eletrônicos, dos eletrodomésticos, entre tantos outros. É por isso que sempre que uma nova coleção de roupas é lançada pelas lojas de departamento, temos a impressão de que as roupas que adquirimos meses antes já estão velhas e fora de moda. Ou quando um novo celular ganha uma câmera a mais e, dessa forma, conseguimos perceber que o modelo do celular é o mais novo e ele passa a ser nosso grande desejo, deixando o aparelho de um ano atrás obsoleto.
O Cartel Phoebus das Lâmpadas
Outra indústria responsável por construir a obsolescência programada como percebemos hoje foi a indústria das lâmpadas que armou uma teoria da conspiração que até parece
coisa de Hollywood mas se trata da vida real. As primeiras lâmpadas incandescentes foram criadas e começaram a ser vendidas no século XIX com um tempo de vida muito curto. Pra você ter uma ideia, as lâmpadas de Thomas Edison, produzida com filamento de carbono, duravam apenas algumas dezenas de horas antes de queimar. Mais tarde com a invenção de lâmpadas com filamentos de tungstênio e bulbos de gás de argônio, o tempo de vida médio de uma lâmpada chegava a 2 mil horas já na década de 1920.
Porém, o que era para ser positivo graças à tecnologia mais avançada, começou a ser visto com maus olhos pelos executivos da indústria de lâmpadas.
Em 1924 as empresas tomaram uma atitude e convocaram as principais empresas de lâmpadas de diversos países.
Nessa conferência as empresas assinaram um documento que iria resultar no Cartel Phoebus, que tem esse nome em homenagem ao deus romano da luz. De forma mais oficial, o documento tinha outro nome: Convenção para o Desenvolvimento e Processo da Indústria Internacional de Lâmpadas Elétricas e Incandescentes. E supostamente tinha o objetivo de “garantir e manter uma qualidade uniformemente elevada aumentando a eficácia da iluminação elétrica e o uso da luz em benefício do consumidor”. Mas se tivesse sido isso mesmo a gente não estaria agora nesse post falando de obsolescência programada.
Na verdade, o que realmente aconteceu foi que as empresas concordaram em diminuir a vida útil das lâmpadas vendidas no mercado para aguentarem no máximo 1.000h de uso, ou seja, não beneficiaram o consumidor. Para que as lâmpadas tivessem uma vida útil menor não bastava usar matérias primas de qualidade inferior; essa manobra exigiu muita pesquisa dos engenheiros e engenheiras das empresas. O acordo era tão rígido que as empresas tinham que regularmente enviar amostras para um laboratório central na Suíça; esse laboratório fazia testes e monitorava o desempenho da lâmpada e os fabricantes que não cumpriam o combinado eram multados.
As manobras do cartel funcionaram e as empresas conseguiram baixar a vida útil da lâmpada que era de 1.800h em 1926 para 1.205h em 1934.
Recentemente o governo de Dubai fez uma parceria com a Philips para que fabricassem uma lâmpada exclusiva para o país. O motivo? Atender às necessidades do país. Por isso, a lâmpada de Dubai consome pouquíssima energia, é extremamente eficiente e dura muitos anos. Parece ser um paraíso e faz a gente se perguntar “quando essa super lâmpada chegará ao Brasil e ao resto do mundo?” A resposta você até já deve ter percebido: não tão cedo. Até porque se fosse diferente não estaríamos aqui falando sobre o cartel das lâmpadas dos anos 20.
O cartel Phoebus continuou na até 1940, quando a Segunda Guerra Mundial tornou difícil as relações entre os países que estavam em lados opostos na guerra. Apesar da extinção do cartel, a obsolescência programada continua até hoje.
A obsolescência programada não foi exclusiva do século passado. Segundo uma pesquisa da Umwelt Bundesamt (agência ambiental do governo alemão) cresceu o número de eletrodomésticos que precisam ser trocados depois de apenas 5 anos de uso. Em 2004, a porcentagem de eletrodomésticos que tinham essa baixa durabilidade era de 3,5% e foi para 8,13% em 2018.
A impossibilidade de consertar seu celular
Outra forma bem comum de diminuir a vida útil do aparelho, é, como já falamos um pouco acima, dificultar ou impossibilitar a troca de peças do aparelho quando elas apresentam defeito. Entre essas estratégias estão a perda de garantia quando o produto é aberto fora da assistência autorizada, além de casos em que a troca da peça quebrada é tão cara que compensa mais comprar um novo aparelho. Isso acontece muito com celulares. Quem nunca conheceu ou foi a pessoa sortuda de quebrar a tela do aparelho, e quando viu o preço que era pra fazer a troca acabou optando por comprar um novo?! Pois é, essa é uma grande estratégia de obsolescência programada que a gente muitas vezes nem percebe.
Mais uma estratégia das empresas para dificultar a manutenção de um aparelho é quando a empresa utiliza um parafuso exclusivo que abre com uma chave de fenda produzida e usada apenas pela empresa.O objetivo disso é impedir que consumidores ou oficinas não autorizadas abram o aparelho. Se o consumidor conseguir passar por esse desafio de abrir o próprio aparelho irá se deparar com peças e fios extremamente delicados e interconectados que podem quebrar quando manuseados por pessoas que não tem a experiência necessária. Além disso, muitas peças são coladas umas nas outras com muita cola, o que impossibilita mais uma vez a troca de uma simples peça.
De acordo com o relatório do Fórum Econômico Mundial, só em 2018 foram produzidas mais de 50 milhões de toneladas de lixo eletrônico no mundo todo. Isso daria para encher mais de 2 mil navios de carga. Se nada for feito, em 2050 o número subirá para 120 milhões de toneladas por ano.
A emissão de gases do efeito estufa como consequência da obsolescência programada
Apenas 20% desse lixo tem um destino ecologicamente correto. Sabe o que é feito com os outros 80%? Enviado para países pobres onde é manuseado por pessoas em situação de vulnerabilidade social, sem nenhum preparo ou proteção, e ainda, por crianças que trabalham de forma informal com todo esse lixo.
Esse tipo de lixo possui inúmeros componentes tóxicos que contaminam o meio ambiente e oferecem risco altíssimo à vida humana. Um dos componentes são os metais pesados: chumbo e mercúrio que podem causar problemas neurológicos. E os ftalatos que são cancerígenos e podem causar malformações em fetos.
No meio ambiente, a obsolescência programada contribui para a emissão de gases estufa, e consequentemente, para as mudanças climáticas. Isso é gravíssimo para os produtos em que se usa muitos recursos naturais finitos para sua produção. Caso você não saiba, aqui vai uma informação chocante: 90% das emissões de gases estufas para a produção de um computador ocorrem no processo de produção e na extração das matérias primas necessárias para sua fabricação. Já o uso do computador durante toda a sua vida útil é responsável por apenas 10% das emissões de gases estufa. Para que o meio ambiente não fosse prejudicado e a humanidade ainda continuasse com seus computadores, seria essencial que a vida útil do computador fosse aumentada. Além dos computadores, é importante destacar as roupas, que concentram 60 a 70% das emissões de gases estufas para serem fabricadas. Já para se fazer um smartphone, a porcentagem sobe para 90% de produção de gases estufa.
Você deve estar pensando: nunca houve no Brasil uma política que gerenciasse o lixo eletrônico? A resposta está na sigla PNRS. O significado é: Política Nacional de Resíduos Sólidos, um documento de 2010 que orienta sobre o correto manejo de resíduos sólidos. A Lei 12.305 responsabiliza fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de produtos que podem virar resíduos no futuro. Isso faz com que seja dever das empresas coletar seus resíduos e fazer a Logística Reversa dos mesmos.
Os elementos finitos que tanto precisamos na tecnologia estão se acabando
Agora que vem uma notícia alarmante: os materiais essenciais para produzir celulares, computadores e demais eletrônicos são finitos, ou seja, em algum momento vão acabar. As reservas de índio (material constituinte das telas touch) podem acabar ainda na década de 2030. Esse elemento químico é apenas o 12º no ranking de elementos em risco de abastecimento, tendo outros 10 elementos que corremos ainda mais risco de ficarmos sem. Entre eles o cobalto (importantíssimo para a produção de baterias), o germânio (usado em fibras óticas) e o gálio (usado em circuitos eletrônicos). Sim, precisamos urgentemente ter a noção de que a Terra possui recursos finitos.
Muitos desses elementos são obtidos de minerais de conflitos, ou seja, minerais comprados de países que financiam guerras civis e abusos dos direitos humanos. 60% do cobalto no mercado internacional é obtido da República Democrática do Congo, que emprega de forma rotineira crianças para a extração dos elementos. A Anistia Internacional já ligou várias empresas ao uso de minérios de zonas de conflito. De uma forma grotesca, a obsolescência programada garante que a demanda por esses minérios continuará alta.
Uma solução simples para todos os problemas advindos da obsolescência programada seria fazer equipamentos que durassem cada vez mais tempo e que a reciclagem de todos os resíduos eletrônicos fosse feita. A partir da reciclagem seria possível recuperar os elementos que temos em falta na natureza, reintegrando o que era “lixo” à cadeia produtiva.
O sociólogo Razmig Keucheyan explica a relação íntima entre o capitalismo e a obsolescência programada. Segundo o cientista, a competição entre capitais privados gera uma necessidade de produzir cada vez mais para gerar cada vez mais lucro. Isso quer dizer que a produção existe não para suprir as necessidades da humanidade, mas para enriquecer. O futuro do Planeta depende de uma produção responsável que siga as demandas necessárias do consumo e não uma produção artificial que visa o lucro através da exploração do meio ambiente e de povos pobres. Infelizmente, essa mudança não acontecerá em um modo de produção como temos hoje e, a menos que a política mude, os modos de produção dificilmente mudarão.
Para que a gente possa ainda hoje construir um futuro sustentável, é imprescindível que a Logística Reversa seja instaurada em todas as indústrias. Dessa forma, tratando seus resíduos sólidos, as empresas podem também, se mostrar mais atrativas aos investimentos de ESG.
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